Por Poliana Costa
No primeiro longa-metragem de ficção do diretor João Jardim, conhecido por documentar aspectos sociais do povo brasileiro, como nos filmes Janela da alma, Pro dia nascer feliz e Lixo extraordinário, chamado Amor?, é posto em debate a violência existente em relações amorosas. Existe amor em uma relação que envolve violência física e psicológica?
É um filme ficcional híbrido, apresentado em formato de documentário. Estruturalmente não traz nada de absolutamente inovador: João Jardim utiliza a mesma estrutura do filme Jogo de cena, dirigido por Eduardo Coutinho em 2007, em que várias atrizes dão depoimentos idênticos aos de outras pessoas, passando a confundir o espectador na mise-en-scène. As histórias se repetem, e os fatos tomam diferentes dimensões entre os entrevistados: a realidade torna-se um jogo nas cenas. João Jardim, após um ano de pesquisa em delegacias e locais de assistência social, opta por realizar uma narrativa com atores que, através de entrevistas, relatam histórias vivenciadas por pessoas reais que sofreram e/ou praticaram violência doméstica. Tais atores, ao entrar em contato com as histórias, relatam-na para o espectador como se as tivessem vivido.
Em Amor?, em meio as entrevistas, há imagens poéticas envolvendo água. As cenas com água transmitem ao espectador uma sensação de calmaria e relaxamento, após ter contato com histórias violentas e impactantes. O apelo sensorial e poético também está contido nas cenas filmadas em plano detalhe dos corpos nus. Os poros da pele, o suor, o contato de corpos nus são exibidos, mostrando o sexo como algo poético, como amor.
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Por Evandro Freitas
Laura, Fernando, Carol, Paulo, Júlia, Cláudia, Lineu e Alice. Histórias de um panorama complexo, muito abordado e pouco compreendido. Personagens através das quais João Jardim busca, em Amor?, provocar uma discussão sobre as fronteiras entre os territórios do amor e da violência, entrecortados por um segmento comum: a dor.
Das personagens independe o nome, mas não suas origens, bem como o modo e forma de contar suas histórias. A visão original apresentada por Amor? – relações amorosas, com uma violência quase inerente – e a importante discussão que ele suscita perdem força no momento de traduzir a vasta pesquisa em filme. João Jardim pretendia com Amor? “uma mistura poética de documentário com ficção”, mas fica a sensação de que ele se perdeu no movediço terreno em que corajosamente se enveredou, esvaindo-se com o filme a poesia e restando ao seu final a interrogação.
Mediados por um documentário, buscamos nos aproximar do real ali representado e seus desdobramentos, permitindo-nos a identificação, emoção e reflexão de suas histórias. O filme documentário é tanto a oportunidade de fruirmos de sua narrativa quanto de atravessá-la, conhecendo por meio dele a relação existente entre documentarista e sujeitos inscritos. Amor? é basicamente um filme de depoimentos, a partir da entrevista é que ele se estrutura. Portanto, nada mais natural que esperar um filme documentário, gênero que recorrentemente se utiliza desta abordagem para suas construções narrativas.
Dramatizar através de conhecidos atores os depoimentos selecionados foi a estratégia utilizada por Jardim para poupar seus entrevistados, evitar constrangimentos éticos e possíveis problemas judiciais. Não que seja esta uma escolha fadada ao equívoco – para tanto ver Jogo de cena (2007), de Eduardo Coutinho –, mas dela originam, em Amor, uma série de artifícios desesperados de proclamação da “verdade” no filme – letreiros que afirmam serem reais aquelas histórias, encenações dedicadas à cópia transcrita do entrevistado –, que comprometem sua narrativa. Aproximam-no de uma estética de documentário datada e retiram do espectador o direito de interagir com o que há de mais intenso nas oito histórias representadas: o real e seus efeitos. O filme, assim, se esvazia. Assistir Amor? transforma-se, então, numa oportunidade de se observar que bons temas, com grande potencial social e narrativo, podem se tornar pouco expressivos, devido suas estratégias de abordagem, escolhas estéticas e intenções éticas.
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Por Larissa Brujin
Cada vez mais fica difícil “enxergar” a linha tênue entre o documentário e a ficção. Uma prova disso é o filme Amor?, de João Jardim, que é um documentário ficcional, porque se utiliza de acontecimentos e depoimentos reais, mas são atores profissionais que aparecem dando o depoimento como se o fato tivesse acontecido com eles próprios. Esse estilo nos lembra o documentário Jogo de cena, de Eduardo Coutinho, que faz esse mesmo jogo com atores e histórias reais.
O filme, porém, se torna cansativo e repetitivo por causa das histórias semelhantes de casais que tem uma relação violenta, seja ela física e/ou psicológica. Muitas das pessoas/personagens não conseguiam pôr um fim no relacionamento por falta de coragem, iniciativa, e até mesmo por amor, talvez por isso o título do filme.
Durante todo o filme imagens da água aparecem para representar as relações das personagens, como uma onda que vai e vem, e, também, para dar uma sensação de calmaria entre um depoimento e outro.
No entanto, a temática é interessante, a violência no relacionamento é um assunto alarmante, principalmente porque em sua maioria quem a sofre é a mulher. Um assunto que vem sendo bastante discutido pela sociedade e pela mídia, chegando, também, no cinema.