Camila Mota
Cinema e música unem-se novamente no documentário de Eryk Rocha. Não é nenhuma novidade vermos essas duas formas artísticas agirem de maneira conjunta, afinal desde os primórdios do cinematógrafo que a música o acompanha. O que chama atenção em Jards é a maneira artesanal com que Eryk Rocha conseguiu moldá-lo. Sem nenhuma fala o filme se desenrola nos estúdios onde o compositor e cantor Jards Macalé esta gravando seu disco que leva o mesmo titulo do filme. Com uma sensibilidade única, o diretor consegue captar os momentos mais marcantes desse processo, desenvolvendo, assim, um exercício de percepção e de olhar.
Os planos utilizados não são muito sofisticados. O que o diretor busca mesmo é uma aproximação do corpo do artista, dos seus pequenos detalhes (olhos, mãos, boca) e traça com isso os planos que muitas vezes se unem, confundem-se e se mesclam, não deixando perceptível até onde vemos o artista a ser filmado, e até onde enxergamos o artista que se está enquadrando, acontecendo assim a performance de duas manifestações (cinema e música) que se unem.
O diretor utiliza de vídeos antigos do próprio Jards no decorrer da narrativa, e revela com isso um domínio concreto das obras do artista filmado, pois sabe muito bem a hora de inserir esses vídeos no meio do filme, causando nos espectadores um sentimento de identificação não só com o cantor Jards, mas também com o próprio período temporal em que as imagens foram captadas. A música que está sendo gravada em estúdio é utilizada de forma belíssima, servindo como intervenções que se complementam a cada sequência, e que afirmam cada vez mais a reformulação do próprio Jards, em um período de renascimento musical.
Canções como Negra melodia e Mal secreto delineiam a narrativa, causando uma sensação de leveza em quem o assiste. Talvez a duração de quase 90 minutos torne o documentário um pouco maçante, mas isso não o impede de ser uma obra bem construída e que merece ser apreciada: digo mesmo que Jards (2012) é um dos poucos longas documentais que vi nos últimos três anos que me prendeu de forma tão arrebatadora na cadeira de um festival. Ao seu término, bati palmas como há tempos não fazia, senti uma necessidade enorme de falar sobre a obra que acabara de assistir, e o Eryk Rocha, que havia me deixado tão inquieta dois anos antes no mesmo festival ao ver Transeunte (2010), conseguiu me surpreender com Jards (2012), que merece ser visto e aplaudido por muitos.
Camila Mota é bolsista Pibex da revista Cinecachoeira