Por João Marciano Neto
Segunda-feira, uma sessão logo após o almoço, era de se esperar que o público aparecesse atrasado, mas neste dia o cronograma foi cumprido normalmente. Alguns obstáculos precisaram ser quebrados, e quando digo obstáculos digo o sono. Na noite anterior fui dormir tarde e pegar uma sala escura logo após um bom almoço era um grande convite para Hipnos. A exibição começou com pouco mais de cinco pessoas ao todo, mas lentamente o número foi aumentado por aqueles que apareceram posteriormente, como já comentei. De qualquer forma, das três competitivas internacionais de curtas que acompanhei, esta foi, a meu ver, a mais fraca, não por causa do baixo público, mas sim devido a maioria dos curtas exibidos.
Apenas dois curtas apresentados foram capazes de dar uma animada nesta amostra, os demais não conseguiram me surpreender, apesar de todos possuírem uma bela composição visual. Tabatô, Exil e The Veredict foram os três primeiros a serem exibidos com pouca expectativa. Nos dois primeiros me deparei com uma grande dificuldade de entender os objetivos de cada um. Tabatô ainda permanece uma incógnita para mim. Já The Veredict revelou-se claramente um pequeno documentário interessante, mas não muito envolvente para o público fora de seu país de origem, a Croácia, principalmente por documentar um acontecimento histórico mais íntimo do país. Tanto o francês Exil contava com uma boa exploração dos cenários, e Tabatô com um uso bem interessante das cores e a montagem, entretanto, deixaram a desejar.
O último curta exibido foi o tailandês Boonrerm, e me surpreendeu encontrar uma produção asiática na competitiva. A história tem uma boa crítica e um tom intimista típico das produções do oriente, seu ritmo é tranquilo, mas apresenta a dificuldade de construir os personagens num tempo tão limitado. A relação do espectador com a protagonista permanece “fria” e um tanto distante mesmo que consiga provocar rapidamente uma simpatia. Boonrerm não foi uma decepção, porém, não me impressionou e encerrou de forma bem amena a sessão.
Não pensem que nesta terceira competitiva não houve grandes emoções. Dois curtas realmente se destacaram de modo quase gritante: O Facínora e The Mass of Men. O Facínora, curta português muito nostálgico, explora o modo de produção de filmes dos primeiros anos do cinema, ou seja, preto e branco e mudo. Além destes valores técnicos, toda a trama, a maquiagem, o figurino e até a trilha foi montada para remeter a esta fase. Muito criativo e divertido, conseguiu me conquistar logo no começo, principalmente por eu ser um destes cinéfilos saudosistas que sabem apreciar um bom filme antigo. As atuações eram excelentes e de longe parecia o melhor da sessão e um dos com mais chances de vitória até ser exibido, logo em seguida, The Mass of Men.
Quem me conhece há algum tempo sabe que possuo certa admiração pelo cinema britânico. The Mass of Men começa com um vídeo de segurança sobre um crime bastante peculiar e em seguida dramatiza o evento de forma espantosa. O espectador sabe o que vai acontecer, mas as reações e as emoções são as mais diversas, e o impacto acaba sendo bem maior do que da primeira vez. Atuações incríveis e uma aproximação com a realidade assustadora retratando bem o mundo caótico e esmagador no qual vivemos. Enquanto este foi de uma seriedade extraordinária, O Facínora foi bem extrovertido e carismático. É até interessante pensar que duas produções tão diferentes tenham sido justamente as mais fortes desta sessão a ponto de realmente conseguir me entusiasmar em meio ao sono com o qual lutava.
Deveras, se existe uma palavra que melhor define toda a Competitiva Internacional de Curtas é “diversidade”. Foram vários trabalhos de vários países, sendo que boa parte deles me surpreendeu bastante, experiências bem agradáveis e um contato fascinante com os filmes que não chegam até nós com a mesma facilidade que chegam no grande circuito. Mesmo não havendo um contato direto com os diretores ou a presença do júri, mesmo com uma recepção abaixo do esperado em Cachoeira, foram exibições muito proveitosas e enriquecedoras. Como cinéfilo posso afirmar que o Panorama conseguiu expandir mais meu repertório e minha visão de como encarar o cinema de forma global. É uma pena que vários alunos do curso de cinema não puderam aproveitar esta oportunidade de entrar em contato com tanta criatividade e estética diversas. Francamente, foi bem enriquecedor.