Por Melissa Segundo
Algumas vezes nos deparamos com surpresas que mudam nosso dia. Navegando na web, sem querer acabei encontrando um curta que acabou me surpreendendo. Ana foi realizado em apenas 48 horas, para a primeira edição do 48 Short Media na cidade portuguesa de Viseu. Levando em conta o período de tempo em que foi feito, era de se esperar que fosse uma produção sem muito a mostrar, mas eis que não é o caso. Com apenas 7 minutos, nos apresenta uma breve reflexão sobre o amor e os limites entre o real e o imaginário.
No enredo, uma paciente conversa com seu psicólogo sobre a dor de estar apaixonada por Ana – uma mulher que não existe! No entanto, o que seduz no curta é a maneira como Ana é retratada. É interessante prestarmos atenção à fotografia para perceber que o mundo de Ana é mais atraente.Quando suas memórias entram em jogo sempre há muita luz no ambiente, até excedendo no uso do Lens Whacking (efeito em que a luz do sol incide sobre a lente). Consolidando uma imagem da perfeição e do verdadeiro amor, sua ausência causa dor para a então paciente narradora. Nas cenas de paixão, o enquadramento é impreciso, o trabalho com a câmera incluindo movimentos rápidos. Assim sendo, somos introduzidos na selvageria do sentimento, contrastando com o mundo real, onde a paciente narradora se encontra sozinha, em recinto escuro e triste. Aqui a escuridão e a imprecisão da imagem condizem com a instabilidade em meio ao sofrimento. A música presente em todo o filme segue lenta e lhe confere um clima dramático na medida certa.
Durante a sessão surgem questionamentos tais como “será assim tão errado estar apaixonado por alguém que não existe?”. Quando a fantasia é melhor que a realidade, o que nos impede de vivê-la? Até mesmo o psicólogo, que deveria se manter imparcial à situação, acaba cedendo aos encantos desse complexo personagem. Ele compreende de alguma maneira essa estranha paixão, pois na verdade Ana é uma fantasia tão bem construída que chega a ser invejável. Em suas reflexões solitárias, ele pondera se a entrega a essa paixão constitui verdadeiramente um problema ou a solução para esse desejo.
Ao sondarmos mais detidamente os diálogos (extremamente) poéticos do filme, poderíamos supor que a personagem Ana representa o anseio do ser humano de encontrar a perfeição, mais precisamente, o parceiro perfeito, o que certamente é impossível. Assim se introduz o conflito de estar apaixonado por alguém irreal. Quem nunca idealizou alguém? Alguém que se encaixaria finamente no molde de nossa pessoa?
Seria então melhor se entregar a um amor, mesmo que irreal, do que ficar só. O filme trata, em suma, sobre como um relacionamento sem pontos baixos, com alguém idealizado por sua mente, seria a fantasia perfeita.Conduzido de forma magistral e poética, com todos os elementos conduzindo ao clima de melancolia e saudade, Ana cativa pela reflexão implícita que propõe e até pela complexidade do tema tratado.
Sendo assim, vale a pena se apaixonar por Ana.