GARAPA

Garapa, 2010, José Padilha

 

Por Jessé Patrício

Desde os anos sessenta com o Cinema Novo, a Caravana Farkas e os documentários sociológicos, que o povo do sertão nordestino ganhou certa visibilidade na cinematografia nacional, porém, poucos filmes dessa vertente cinematográfica conseguiram mostrar a miséria de um povo esquecido pelos poderes públicos através de anos como o documentário, Garapa, (2010) de José Padilha. No filme não há uma voz off que, através de dados sociológicos, explica o problema em determinada região; ou adaptação de romance literário para o cinema que, através de uma estética neorrealista, tenta mostrar o sofrimento enfrentado pelo povo sertanejo. O que há em Garapa é a dor de um povo que não perde a fé na vida, e mesmo diante de tantas adversidades que o mundo impõe, vai fazendo de cada dia uma luta pela sobrevivência.

Padilha e sua equipe passaram um mês no interior do Ceará acompanhando a vida de três famílias, a de Rosa, Robertina e Lúcia, e o que vemos na tela é um retrato de um país subdesenvolvido que, apesar de alguns poucos avanços em programas sociais, não conseguiu extinguir a fome por que passam milhões de pessoas vivendo na miséria extrema. Em Garapa estamos diante de um Brasil que não está nos reality shows, nas novelas, ou nos telejornais. Estamos diante de uma situação angustiante que a todo o momento nos toca: a fome alheia. E a fome no documentário não tem cor, não têm músicas melosas que influenciem nossos sentimentos ou planos bem enquadrados, e essa certa secura estética acaba por favorecer o documentário. Pois a triste realidade registrada pela câmera ali presente e a forma que o filme foi montado já são suficientes para tirar nossa passividade diante do que assistimos nos confortáveis sofás de nossas casas ou em alguma poltrona de cinema.

O filme assume uma estética observativa, na qual a presença do diretor só se mostra poucas vezes, pois é impossível ficar passivo diante de tantas situações horrendas e não tentar entender através dos depoimentos como eles conseguem sobreviver. Entre outras situações que aparecem no decorrer do filme, a título de exemplo, pergunta-se para Robertina, que mal consegue se sustentar sozinha na situação em que vive, com onze filhos, o porquê ela não faz tratamento para não engravidar.; ou uma conversa com o marido de Rosa, que acaba se tornando emblemática da ajuda social recebida do governo por algumas famílias; ou o comprimido que o diretor do filme dá para uma criança com dor de dente…

No filme não estamos diante só da fome crônica que assola em torno de 11 milhões de pessoas no Brasil, segundo o IBASE de 2007, e 195 milhões no mundo, segundo dados da ONU de 2006. O que nos é mostrado é uma situação desumana na qual as pessoas que participam do documentário moram em casas que só servem mesmo para as protegerem do sol e da chuva, sem nenhum móvel: as crianças dormem em redes ou em colchões velhos no chão. Não há energia elétrica, nem água potável e tampouco saneamento básico. E as crianças, que já passam por problemas de desnutrição, estão à mercê de várias outras doenças por causa da pouca ou quase nenhuma higiene, com moscas a grudar em seus corpos o tempo inteiro.

O filme encerra com uma criança bebendo um copo de garapa – é a fome que bate e precisa ser enganada. Com a subida dos créditos, há o silêncio, pois não existe música para representar tamanha desgraça, não há aplauso entusiástico. O que fica é um sentimento de angústia e revolta. Pensemos na coragem daquelas pessoas, que diante de situações como esta aceitam ter suas vidas registradas na esperança de que os problemas enfrentados sejam notados por alguém. Rosa, Robertina e Lúcia e seus familiares, entre outros milhões de pessoas que vivem na mesma situação, estão presas numa gaiola social e, ao que parece, não há governantes interessados em abrir a porta para uma liberdade mais digna e humana.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

4 comentários sobre “GARAPA

  1. Janaina

    Pk essas pessoas do sertao,sao tao eskecidas ate msm nos dias de hj?
    … com tantas pessoas tendo mais ke o necessario e essas pessoas passando por necessidades !

  2. ana lucia de santana oliveira

    Assisiti esse documentário duas vezes e fiquei muito emocionada em que vi. Se eu tivesse condições financeiras eu ajudarei essas pessoas, principalemnte Lucia e seus três fihos, e fiquei muito irritada com seu marido por tratá-las daquele modo. Gostaria de ter contato com essas pessoas para ver o qeu posso fazer por elas. Ana Lucia.

  3. Marily

    Gostaria que pelo menos parte desse documentário fosse visto pelos parlamentares em alguma sessão onde pelo menos a maioria estivesse presente.
    Pois segundo Dilma Roussef, estamos acabando com a fome no Brasil.
    E eu pergunto…Qual Brasil?

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