ESTÔMAGO

 

Por Camila Mota

 

No estomago tudo se mistura e vira uma coisa só.

Raimundo Nonato, é o protagonista nessa história, vindo do interior, ele chega na capital para tentar mudar a sorte e melhorar de vida.

No primeiro momento temos a apresentação de Raimundo Nonato e de Seu Zulmiro, e quando pensamos que o fio narrativo da história será clássico, nos deparamos com a primeira característica que já demonstra que o filme tem muito mais para contar e mostrar do que imaginamos.

O diretor utiliza-se de uma montagem picotada, onde vai mesclando sequências de Raimundo Nonato trabalhando em um restaurante, e cenas do mesmo na cadeia. O espectador fica sem saber ao certo o porquê dele estar preso, e no decorrer do filme a história vai sendo montada como um quebra-cabeça, criando sensações diversas e questionamentos infindáveis, porém a descoberta do porquê ele esta preso só acontece mesmo nos minutos finais do filme.

É visível assim que na narrativa fílmica o diretor aborda dois grandes problemas da sociedade brasileira, a migração de pessoas que saem do interior e vão para a cidade grande, e a precariedade do sistema penitenciário brasileiro.

Raimundo Nonato é um interiorano que chega na capital “com uma mão na frente e outra atrás” e conhece seu Zulmiro em uma situação um tanto constrangedora. Seu Zulmiro é dono de um boteco, no qual Raimundo come duas coxinhas, porém ao fechar o bar e ir atrás do seu pagamento seu Zulmiro recebe um “não tenho dinheiro” como resposta. É a partir dessa resposta que a história começa a se desenvolver, seu Zulmiro, que não quer ficar no prejuízo, manda que Raimundo lave os pratos como forma de quitar sua divida. Ao pedir que o mesmo além de lavar os pratos também limpe toda a cozinha, oferece-lhe um quartinho para dormir, e assim desenvolve- se o convívio desses dois personagens.

Com relação a parte de crítica social do filme, o sistema penitenciário brasileiro está a cada dia que passa mais debilitado, as condições desumanas a que os presos são submetidos ficam bem evidentes no filme, pois em uma cela que comporta 4 presos, existiam, na verdade, nove (ou, na vida real, vinte cinco ou até mesmo mais). Há também a violação dos direitos dentro do cárcere, quando mostra que os policiais contrabandeavam coisas para dentro do presídio. É ainda interessante que nas cenas do presídio o filme remete muito ao documentário O prisioneiro da grade de ferro (Paulo Sacramento, 2009), pois coisas que são mostradas no documentário, como o contrabando feito por policiais, o Rei da Cela (aquele que manda em todos os outros detentos que estão na mesma cela), e a feitura de cachaça dentro da própria penitenciária, também são mostradas no filme Estômago, é uma crítica muito válida feita pelo diretor, já que aborda através do lado culinário, e um tanto quanto mais sensível, problemas graves e que perduram nos dias atuais.

É assim uma parte do filme que leva o espectador a pensar, e muito, nos problemas que a nossa sociedade enfrenta e até mesmo a se identificar em alguns momentos com o protagonista, vendo assim o sofrimento e as humilhações que muitas pessoas que saem do interior e vão para a capital enfrentam.

A prisão de Raimundo Nonato ocorre devido a um assassinato que ele cometeu, ao se envolver com Iria, uma prostituta. A definição de amor para ambos se dá através de cheiros e sensações que são causados pela comida, sensações estas até então desconhecidas para ambos. O caso, que vai ficando cada vez mais quente no decorrer do filme, é abalado quando Raimundo Nonato descobre que Iria tinha um caso com outro homem. Assim ele mata os dois, e como prêmio retira uma parte dos glúteos de Iria e frita com muito alho, cebola e alecrim, o que evidencia que aquele amor despertado por cheiros e sensações, transformou-se em um ódio canibalesco, onde só a carne dela saciaria a sua fúria e raiva por ter sido traído.

Estômago é assim um filme forte, que vem pautado em cima de diálogos bem construídos, personagens bem estruturados, e que envolvem o espectador em uma trama de casos, e acasos, que vão ficando cada vez mais evidentes, deixando o espectador sobressaltado por abordar temas tão polêmicos de uma forma ao mesmo tempo tão sensível e tão brutal.

 

2 comentários sobre “ESTÔMAGO

  1. rafa

    Pois é… Nonato sabia da profissão de Irian… sempre soube. E mesmo quando passou a se relacionar com ela de forma mais intensa, Irian não deixou seu trabalho. Inclusive na noite do crime Nonato vai tentar encontra-la no ponto de trabalho dela.

    Irian não respondeu sim nem não ao pedido de casamento de Nonato. Ela se afogou com as azeitonas quando Nonato fez o pedido. O relacionamento deles não tinha nada sério.

    Irian não traiu ninguém.

    O problema foi o beijo que Irian se negava a dar em Nonato e este a viu beijando outro. A furia se acendeu neste momento.

    O que justifica Nonato ter assassinado Irian?

  2. rafa

    Nonato pediu a Zulmiro para que fosse padrinho de seu noivado.
    Zulmiro, aquele que o tratou como escravo.
    Nonato não preferiu Giovani, aquele que o tratou como um bom cozinheiro e lhe pagando salario e beneficios.
    Porque Nonato preferiu Zulmiro?

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